segunda-feira, 9 de março de 2009


Artigo sobre: Preconceito Linguístico e a "Norma Padrão"


Introdução


Este trabalho tem como objetivo discutir o preconceito linguistico em forma de mitos (como destaca Marcos Bagno) que ocorre entre alunos e professores em processo de trabalho com a linguagem. Na segunda parte discutiremos novas perspectivas em relação ao trabalho com a língua e suas múltiplas possibilidades. Para embasar nosso objetivo utilizaremos as concepções proposta por Marcos Bagno em suas obras “Preconceito Linguistico; o que é, como se faz” e “A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira”, além das discussões feitas por Possenti em seu livro “Por que (não) ensinar gramática na escola”.



1. Realidade, Verdade ou Mitos??



[...] a linguagem, de todos os instrumentos de controle e coerção social, talvez seja o mais complexo e sutil, sobretudo depois que, ao menos no mundo ocidental, a religião perdeu sua força de repressão e de controle oficial das atitudes sociais e da vida psicológica mais íntima dos cidadãos.
(Bagno 2003: 16)

Podemos afirmar, até por experiência, que o preconceito em relação ao uso efetivo da língua se faz presente nas escolas e, entre os professores e alunos que ao fazer uso efetivo da língua se veem diante de uma série de coerções e discriminações que acabam se perpetuando no âmbito escolar, local onde, pelo contrário, deveria ser o espaço da diversidade e das múltiplas possibilidades da linguagem.

A escola se apresenta como uma oportunidade ímpar na discussão de preconceitos e injustiças sociais. No entanto, é com pesar que verificamos que ela não é palco de debates, mas sim um palco de marionetes. Nossa escola reproduz, comandada pelos fios do preconceito e do poder, a noção estereotipada do “índio” genérico, o mito da unidade lingüística, a exaltação da norma culta como instrumento de ascensão social, o mito da “democracia racial”. Como instituição delimitadora, ela pode “fabricar” indivíduos que serão peças dos jogos de poder.

O preconceito linguistico fica bastante claro em diversas afirmações que fazem parte da imagem (bem negativa) que o brasileiro tem de si mesmo e da língua falada no país. Em seu livro Preconceito Linguistico, Marcos Bagno nos chama atenção para uma série de mitos que compõem o imaginário social a respeito da língua Portuguesa e que por conseqüência rondam as aulas de Língua Portuguesa e representa conflitos entre os próprios falantes (professores e alunos):

1° Mito - “A língua portuguesa falada no Brasil apresenta uma unidade surpreendente”, segundo o autor, esse mito está arraigado em nossa cultura que até mesmo intelectuais de renome, pessoas de visão crítica e geralmente boas observadoras do fenômeno sociais brasileiros se deixam enganar por ela.

2° Mito – “Brasileiro não sabe português / só em Portugal se fala bem português”, segundo o autor, essas opiniões tão habituais, corriqueiras e comuns são na realidade duas faces da mesma moeda enferrujada, refletem o complexo de inferioridade, o sentimento de até hoje ser uma “colônia” dependente de um país considerado mais “civilizado”.

3° Mito – “Português é muito difícil”, essa talvez seja a sensação mais vivida entre os falantes da Língua Portuguesa, principalmente alunos e professores, o autor explica que como o ensino da língua sempre se baseou na norma gramatical de Portugal, as regras que aprendemos na escola em boa parte não correspondem à língua que realmente falamos e escrevemos no Brasil. Por isso que “português é uma língua difícil”: porque temos de decorar conceitos e fixar regras que não significa nada para nós.

4° Mito – “As pessoas sem instrução falam tudo errado”, esse tipo de preconceito ocorre devido à concepção de que só existe uma única língua e que seria a ensina na escola e já faz parte do imaginário social e escolar.

5° Mito – “O lugar onde melhor se fala português no Brasil é no Maranhão”, esse é outro problema que assola o imaginário social. Segundo o autor o que acontece no Maranhão é a mesma coisa que acontece em Portugal em relação ao português do Brasil: todas as variedades surgem para atender uma necessidade local, ou regional, não existe uma variedade “melhor”, “mais pura”, ou “mais bonita”. O autor destaca que no Maranhão a construção: Esse é um bom livro para ti ler, em vez da forma “correta”, Esse é um bom livro para tu leres, contribui para mostrar que a língua é usada por falantes reais cuja linguagem varia de acordo com contexto e necessidades diferentes e que esse mito é falação.

6° Mito – “O certo é falar assim porque se escreve assim”, esse é outro mito que ronda as aulas de língua portuguesa. Para o autor ainda existe uma tendência no ensino da língua de querer fazer com que o aluno pronuncie “do jeito que se escreve”, acreditando que essa seja a única maneira “certa” de falar o português e que os alunos devem seguir assim sua vida linguistica.

7° Mito – “É preciso saber gramática para falar e escrever bem”, esse mito é tão forte no imaginário social, que, os pais de alunos cobram dos professores o ensino efetivo da gramática como se esta fosse o mais importante das aulas de português. Quando se fala em aula de língua portuguesa, a aula de gramática ainda é tida como principal por se tratar de um instrumento de ascensão social, “a língua do vestibular”.

8° Mito – “O domínio da norma culta é um instrumento de ascensão social”, segundo o autor é muito comum encontrar pessoas muito bem-intencionadas que dizem que a norma padrão conservadora, tradicional, literária, clássica é que tem de ser mesmo ensinada nas escolas porque ela é um “instrumento de ascensão social”.


Em entrevista realizada com professores e alunos de escolas públicas durante o mês de Fev/2009, pudemos perceber de que forma esses mitos se materializam na fala, de um lado os professores como intermediadores da língua “culta” e o seu ensino efetivo, e, de outro, os alunos com suas linguagens e concepção de que tem de aprender a língua para “falar e escrever melhor”.

Nossa intenção é verificar que concepção de língua os professores e alunos põem em prática quando o assunto é Língua Portuguesa e seu uso efetivo. Primeiramente perguntamos aos alunos o que de fato representava o aprendizado da Língua Portuguesa para eles, vejamos o que foi dito:

“O português é importante para podermos aprender a falar e escrever melhor em situações como serviço, na escola, e, também para poder fazer bonito na redação do vestibular”.

“Eu acho um pouco difícil aprender português, é muito complexa, mas é importante porque precisamos dela no dia a dia e é a língua certa”.

“Falar coreto hoje em dia é essencial para alcançarmos os nossos objetivos, passarmos no vestibular e aprendermos a regras para escrever melhor”.

“Eu tenho dificuldade de aprender as regras, mas é importante aprender para poder escrever melhor e se dar bem na vida”.

“A gente precisa aprender o português para melhorar de vida, passar de ano na escola, e arrumar um bom emprego, e seguir os estudo”.

Fica evidente que, para os alunos, a Língua Portuguesa é vista como “importante para podermos aprender a falar e escrever melhor”, “um pouco difícil aprender português”,
“é a língua certa”, “é essencial para alcançarmos os nossos objetivos”, “é importante aprender para poder escrever melhor e se dar bem na vida”, “precisa aprender o português para melhorar de vida, passar de ano na escola, e arrumar um bom emprego, e seguir os estudos”

Podemos afirmar que os mitos citados por M. Bagno de fato se materializam na concepção de aprendizagem da língua por parte dos alunos. A língua passa a ser considerada como um produto, instrumento de ascensão social, ferramenta para escrever melhor, a “língua certa”. Segundo (Bagno 2003:105) “a tentativa de aquisição da norma-padrão como um “bem de consumo” encontra ampla colhida em determinadas camadas sociais que veem no domínio desses estereótipos linguisticos um pretenso instrumento de “ascensão social” e de “inserção no mercado”. A “língua certa” se torna, assim, um objeto de desejo para esses grupos, demanda que é atendida pelo comércio com a transformação dessa “língua” num bem de consumo supostamente acessível a todos e disponível sob as mais diferentes embalagens e modelos".

Do outro lado, estão os professores que também se posicionam diante da Língua Portuguesa e seu ensino:

“Nós ensinamos o português para os alunos para que eles tenham um futuro melhor diante da vida, e para que eles saibam usar a língua quando precisarem”.

“A língua Portuguesa tem de ser vista pelo aluno como uma possibilidade de ascensão e uma oportunidade para que ele conheça a sua língua como de fato ela é usada no dia a dia”.

“Sempre chamo a atenção para a necessidade de aprender as regras e estruturas da língua, é uma oportunidade para eles aprenderem a ler e escrever melhor, a lidar com textos produzidos pela sociedade e vir a ter sucesso em seus estudos”.

“A língua Portuguesa é patrimônio deles se eles não se conscientizarem disso sempre estarão em uma situação difícil é o que eu digo sempre que ensino gramática e texto para eles”.

“Procuro ensinar a gramática e chamar atenção para as propriedades da língua, para que eles venham a ser melhores leitores e escritores e que tenham um maior nível intelectual em relação a Língua Portuguesa".

Para os professores, o ensino da Língua Portuguesa tem por objetivo “um futuro melhor”, “saibam usar a língua quando precisarem”, “tem de ser vista pelo aluno como uma possibilidade de ascensão e uma oportunidade para que ele conheça a sua língua como de fato ela é usada no dia a dia”, “chamo a atenção para a necessidade de aprender as regras e estruturas da língua, é uma oportunidade para eles aprenderem a ler e escrever melhor e ter sucesso em seus estudos”, “A língua Portuguesa é patrimônio deles se eles não se conscientizarem disso sempre estarão em uma situação difícil”, “Procuro ensinar a gramática para que eles venham a ser melhores leitores e escritores”.

Essa entrevista revela duas concepções (mitos) que ainda permeiam a vida acadêmica dos professores: primeiro a língua é vista como um produto (patrimônio) que deve ser adquirido pelo aluno para que este se saia bem em determinadas situações e tenha ascensão social e, em segundo, aprender a língua é uma oportunidade de “ler e escrever melhor”. Além disso, os professores afirmam ser necessário aprender a estrutura e as regras gramaticais para que os alunos possam ter a posse da língua exigida pelo “dia a dia”, ou seja, a norma padrão.

Podemos afirmar que entre professores e alunos ainda o que se faz presente é os mitos citados por M. Bagno quando o assunto é a Língua e seu uso. Torna-se evidente que o preconceito linguistico se faz presentes nessas vozes que preenchem o espaço escolar. Estudar a língua se faz necessário para ter “ascensão social” e falar a língua “certa”, ou seja, as outras variedades nem se quer entram em questão quando se trata da Língua Portuguesa; “esse prestígio social é uma construção ideológica: por razões históricas, políticas, econômicas é que determinadas classes sociais e outras não assumiram o poder, ganharam prestígio ou, melhor, atribuíram a si mesmas”. (Bagno, 2003: 66).

Como tentamos demonstrar, os mitos discutidos pelo autor M. Bagno se fazem presentes quando o assunto é Língua Portuguesa. Para o autor “a norma-padrão está estreitamente ligada à escola, ao ensino formal” (M. Bagno 2003: 69). Portanto, discutir essa ligação se torna necessário para tentar transpor o ensino da língua para uma nova postura tanto dos alunos quantos dos professores. A seguir tentaremos discutir novas possibilidades no processo de ensino-aprendizado da língua no âmbito escolar e social.




2. Uma nova postura o que muda?



[...] Uma das tarefas do ensino de língua na escola seria, então, discutir os valores sociais atribuídos a cada variante linguistica, enfatizando a carga de discriminação que pesa sobre determinados usos da língua, de modo a conscientizar o aluno de que sua produção linguistica, oral ou escrita, estará sempre sujeita a uma avaliação social, positiva ou negativa.
(M. Bagno, 2003: 150).

Discutir a Língua nos âmbitos escolares, portanto, tomaria outro sentido, o sentido de que cada variante linguistica compõe o que chamamos Língua Portuguesa, e conhecê-las e valorizá-las se torna tão importante quanto dominar a norma-padrão defendida pelas camadas que dominam as pirâmides sociais. Para Possenti (1996: 84) fica óbvia a necessidade de expor o aluno a experiências que o obriguem a viver a variedade que se quer que ele aprenda. Fica óbvia também a ideia de que, antes de descrever a sintaxe e a morfologia das expressões, o professor deve certificar-se de que o aluno sabe usá-la e entendê-las.

Se para enfrentar o preconceito é necessário conviver com a diversidade, também se faz necessário que o trabalho com a língua ganhe nova interpretação como propõe Bagno (2003: 54):


Norma Padrão

Prescritiva (normativa)

“Língua” prescrita nas gramáticas normativas, inspiradas na literatura “clássica”.

Preconceito (baseia-se em mitos sem fundamentação na realidade da língua viva, inspirados em modelos arcaicos de organização social).

Doutrinária (compõe-se de enunciados categóricos, dogmáticos, que não admitem contestação).

Pretensamente homogênea.

Elitista

Presa à escrita literária, separa rigidamente a fala da escrita.

Venerada como uma verdade eterna e imutável (cultuada).

Norma Padrão (proposta)

Descritiva (normal)

Atividade linguistica dos “falantes cultos”, com escolaridade superior completa e vivência urbana

Conceito (termo técnico usado em investigações empíricas sobre a língua co-relacionados com fatores sociais).

Cientifica (baseia-se em hipóteses e teorias que devem ser testadas para, em seguida, ser validadas ou invalidadas).

Essencialmente heterogênea.

Socialmente variável.

Se manifesta tanto na fala quanto na escrita.

Sujeita a transformações ao longo do tempo.


Como podemos ver, o ensino da norma padrão tomaria outro sentido: descritivo e heterogêneo, ao invés de ser, prescritiva e homogênea. Esse fato é essencial para que o ensino da norma padrão não continue a estimular o preconceito linguistico evidenciando a norma-padrão como a única possível, e, principalmente, a escola deveria ser palco da diversidade. Possenti (1996) reforça que “seria incoerente concordar com formas de ensino que reduzem a língua a uma única variedade, mesmo que se trate da variedade socialmente prestigiada”.

Adotando uma nova postura diante do ensino da língua portuguesa e do aprendizado efetivo dos alunos, fica evidente colocar os “pingos no i” quando se trata de erro. Para Bagno (2003: 124) “ninguém comete erros ao falar sua própria língua materna, assim como ninguém comete erros ao andar ou ao respirar. Só se erra naquilo que é aprendido, naquilo que constitui um saber secundário, obtido por meio de treinamento, prática e memorização: erra-se ao tocar piano, erra-se ao dar um comando ao computador, erra-se ao falar/escrever uma língua estrangeira. A língua materna não é um saber desse tipo: ela é adquirida pela criança desde o útero, é absorvida junto com o leite materno. Por isso qualquer criança entre 3 e 4 anos de idade (se não menos) já domina plenamente a gramática de sua língua”.

Portanto, o “erro” deve ser interpretado pelo professor como desvio e não como um erro. Se, sabemos que, o erro é considerado por referir-se a norma-padrão como “certa”, é necessário e pedagogicamente proveitoso substituir a noção de erro pela tentativa de acerto. Afinal, a língua escrita é uma tentativa de analisar a língua falada, e essa análise será feita, pelo aluno que escreve no momento de grafar sua mensagem, de acordo com o seu perfil sociolinguístico.

Com isso não queremos incentivar o vale tudo na língua, mas deixar evidente que para a gramática descritiva, da qual acreditamos, só seria “erro” a ocorrência de formas ou construções que não fazem parte, de maneira sistemática, de nenhuma das variantes da língua. A adoção de um ponto de vista descritivo permite-nos evidenciar uma diferença que nos parece essencial: a distinção entre diferença linguistica e “erro” linguístico.

Outro fator importante é que, para assumirmos uma nova postura, julgamos necessário adotar em sala de aula algumas atitudes para que o ensino e aprendizado da língua se tornem de fato um ensino que ao mesmo tempo em que contempla a variedade linguistica, liberta o professor e o aluno para uma postura mais objetiva e menos preconceituosa em relação à língua. Bagno (2003) oferece uma proposta que nos parece definir bem aquilo que dissemos ao longo desse trabalho:


3. Dez Cisões


1° Conscientizar-se de que todo falante nativo de uma língua é um usuário competente dessa língua, por isso ele SABE essa língua. Entre 3 e 4 anos de idade, a criança já domina integralmente a gramática de sua língua. Sendo assim,

2° aceitar a ideia de que não existe erro de português. Existem diferenças de uso ou alternativas de uso em relação à regra única proposta pela gramática normativa.

3° Não confundir erro de português (que, afinal, não existe) com simples erro de ortografia. A ortografia é uma decisão política, é imposta por decreto, por isso ela pode mudar, e muda, de uma época para outra.

4° Reconhecer que tudo o que a Gramática Tradicional chama de erro é na verdade um fenômeno que tem uma explicação cientifica perfeitamente demonstrável.

5° Conscientizar-se de que toda língua muda e varia. O que hoje é visto como “certo” já foi “erro” no passado.

6° Dar-se conta de que a língua portuguesa não vai nem bem, nem mal. Ela simplesmente VAI, isto é, segue seu rumo, prossegue em sua evolução e transformação.

7° Respeitar a variedade linguistica de toda e qualquer pessoa, pois isso equivale a respeitar a integridade física e espiritual dessa pessoa como ser humano, porque

8° a língua permeia tudo, ela nos constitui enquanto seres humanos. Nos somos a língua que falamos. A língua que falamos molda nosso modo de ver o mundo.

9° uma vez que a língua está em tudo está em tudo e tudo está na língua. O professor de português é professor de TUDO!

10° Ensinar bem é ensinar para o bem. Ensinar para o bem significa respeitar o conhecimento intuitivo do aluno, valorizar o que ele já sabe do mundo, da vida, reconhecer a língua que ele fala a sua própria identidade como ser humano.


Reconhecendo que nosso trabalho com o professor é colocar o aluno em contato com as variedades linguísticas, temos de repensar o preconceito linguistico que ronda os compêndios escolares e que assola, como vimos, a concepção de professores e alunos quanto à noção de Língua Portuguesa como restrita apenas a uma forma, e vista como um produto que permitira a quem comprá-lo um passaporte para ascensão social e intelectual.

Concordamos com Bagno (2003: 186) quando afirma que “um ensino de língua materna comprometido com a luta contra as desigualdades sociais e econômicas reconhece, no quadro dessas relações entre escola e a sociedade, o direito que têm as camadas populares de apropriar-se do dialeto de prestígio, e fixar-se como objetivo levar os alunos pertencentes a essas camadas dominá-los, não para que se adaptem às exigências de uma sociedade que divide e discrimina, mas para que adquiram um instrumento fundamental para a participação política e a luta contra as desigualdades sociais”.

A intenção, portanto, é, ensinar a norma-padrão como uma ferramenta para que o aluno possa interagir socialmente quando for solicitado em relação à norma-padrão, diminuindo, portanto, o preconceito linguistico e conscientizando-se de que a norma-padrão é uma variedade entre todas as outras socialmente constituídas. Para isso se faz necessário que o professor adote uma nova reflexão a respeito da língua considerada padrão, vendo-a, não mais como passaporte para a ascensão, mas como uma riqueza cultura e uma entre as várias possibilidades linguísticas que merece atenção e consideração.


4. Como fazer com que o ensino da gramática seja significativo e leve ao domínio e uso social da língua?


A gramática descritiva (conjunto de regras que são seguidas) revela-se mais próxima da realidade lingüística dos alunos descrevendo o uso da língua sem descriminar erros. A proposta de trabalhar nas escolas com essas três concepções de gramática, em ordem de prioridade inversa, privilegiando a gramática internalizada, em seguida a descritiva e, por último a normativa. Aumenta os recursos lingüísticos por parte do aluno. Isso se faz expondo o aluno consistentemente a formas lingüísticas que ele não conhece, mas deve conhecer para ser um usuário competente da língua escrita. Só um bom programa de leitura pode produzir a exposição necessária no aprendizado ativo.

Seria incoerente concordar com forma de ensino que reduzem a língua a uma única variedade, mesmo a socialmente prestigiada, o ensino deve priorizar a língua como conhecimento interiorizado. É necessário viver a variedade que se quer que o aluno aprenda, antes de escrever, o professor deve certificar-se de que o aluno sabe usá-las, é no momento em que o aluno começa a reconhecer sua variedade lingüística como uma variedade entre outras que ele ganha consciência de sua identidade linguística e se dispõe á observação das variantes que não domina.

Existe a percepção que para a lingüística vale tudo, não é verdade esse julgamento vem de pessoas que não concorda com que a lingüística descobriu, ainda é de praxe que se conceba língua como gramática “manutenção de uma norma imutável, por que não poderia a escola acompanhar mais de perto a norma culta real, tal como ela é utilizada, por exemplo, nos jornais, que, para ficar num exemplo já abandonaram alguns termos como a regência indireta de “assistir”, futuros sintéticos ex: “vou sair” no lugar de “sairei”, “fora”, no lugar de “tinha ido”, a gramática normativa considera esses usos como um problema. Para a gramática descritiva, nenhum dado é desqualificado como não pertencendo a língua, ao contrário, considera um fato a ser descrito e explicado – a língua falada ou escrita como sendo um dado variável. Tratar esses usos inadequados como marcas de incompetência ou “burrice” produz resistência do aluno, que tenderá a achar-se “fraco” ou “sem capacidade” papel que lhe é atribuído por preconceito.



Conclusão


Como se vê não está se propondo uma substituição ou troca de gramática, mas se propõe apenas bom senso, um, pouco de capacidade de observação e disposição para abrir mão de atitudes puristas em relação á língua. (isso não quer dizer que a gramática não seja importante), é relevante saber que existem vários modos de se trabalhar gramática e língua nas escolas e, essas concepções são apenas uma delas.

Esperamos que essas discussões atinjam um número grande de pessoas e profissionais com a intenção de chamar a atenção para a armadilha ideológica que nos interpela revelando a diversidade como “erro” e valorizando a língua considerada pela elite como padrão, que por falta de conhecimento, ainda reproduz uma concepção de língua tipicamente retrógrada e purista.



BIBLIOGRAFIA


BAGNO, Marcos. A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.

_______ (2005): “Preconceito linguistico: o que é, como se faz”. Edições Loyola, São Paulo, Brasil.

POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas, SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil, 1996.